quinta-feira, fevereiro 26, 2009

Memórias de um ex-Pastor




16 comentários:

Anónimo disse...

Gostei do detalhe quando referes “ …fiz com um rebolo uma grande mossa no fundo da lata…” para arranjares uma desculpa convincente, para a falta de leite na lata. Esta artimanha foi jeitosa.

Boa, venha dai a proxima!

famel disse...

Artimanhas de pastor conheço algumas, muitas foram mesmo congeminadas nos meus neurónios. Quando as cabras fugiam para as couves, tinha que tirar as folhas roídas para que a minha mãe não desse conta do sucedido. Às tantas já as couves estavam quase "depenadas", aí arrancava-as pela raíz, atirava-as para as silveiras e ia buscar um pedra que metia então no lugar dos buracos da raíz. Pensava eu que a minha mãe não reparava. Coitada quando chegava ao Casal da Pires em vez de um campo de couves, tinha um campo de batalha...Lá me dava uns ralhetes mas pouco mais...

Nos primeiros dias de Primavera também adormeci muitas vezes debaixo de uma oliveira, às tantas já as vinhas da vizinha tinham levado ripada. Aí já não havia grandes artimanhas a fazer, não me ia por a arrancar a vinha....
O único remédio era o meu pai levar um garrafão de vinho ao vizinho depois da vindima!

Também era dada a cantarolices durante a pastoricia. Será escusado dizer que no tempo do festival da canção as cabras comiam pouco, pois eu espatava-as com os meus berreiros ihihihhih
Só a "Dondinha" parecia gostar de me ouvir cantar...

A sorte da minha mãe foi mesmo o facto de eu só ser pastora de fim de semana. Tarefa que ainda hoje desempenho com muita alegria quando a minha mãe me pede ajuda! Mas hoje já não as deixo comer a horta nem a vinha, apenas as laranjas que vão na minha mochila!!!!

Dos tempos de pastorita lembro-me ainda com muita alegria da passagem da cabras do Penedão para o Valminhoto, era uma manhã inteira a caminhar com a minha irmã e a cantar as rapsódias das músicas dos desenhos animados!
Tenho também ainda uma cicatriz num osso da bacia que me fez o xibo cornudo "Visigodos", culpa do meu irmão que adorava atiçar o bicho!

De todos os trabalhos do campo o que mais gostei foi sem duvida ser pastora...

Anónimo disse...

De tudo o que se passou, aquilo que me deixou muitas saudades, e ainda me faz crescer água na boca era comer uma malgada de leite "mossiço", coado por um raminho de "fetos", com broa, sentadinha debaixo de uma nogueira num dia de calor, a ouvir a água fria do "lamero cemero" correndo barroco abaixo....

sobralfilho disse...

Hei! Virgílio Neves
Apreciei as tuas memórias pastoris. E, ainda, por cima… relembras Cabral!
Não o Cabral – das cabras de Belmonte que diziam terem os amojos grandes – mas, o pastor mais ladino que alguma vez pastoreou nos matos do Sobral. A sua fama perdurou por largos anos: Dizia-se que quando chegava (à volta das dez horas – no horário de Inverno) ao curral para deitar as cabras comia logo a merenda. E depois como lá pela tarde a fome apertava metia as cabras cedo! Era hábil no manejo da pedra. Uma pedrada sua acertava sempre no alvo. Ninguém queria tê-lo por inimigo. Conta-se que um dia lá para os lados do Castelejo um grupo de indivíduos armados de paus fez uma espera ao pessoal do Sobral contratado para a ceifa pelos latifundiários da Campina. Parece que os ceifadores do Sobral aguentavam melhor aquele árduo trabalho da ceifa debaixo do calor tórrido dos meses Junho/Julho e, por isso, pagavam-lhes mais, logo eram alvos da inveja dos grupos concorrentes. O grupo do Sobral integrava o Cabral que nos momentos iniciais da luta deixou de ser visto. Todos pensaram que cobardemente fugira. E paulada a um, paulada a outro, lá fazia pela vidinha. Até que viram o amigo Cabral detrás dum arbusto a atirar pedras. Escusado será dizer que cada pedrada era um homem no chão. Acabada a luta o Cabral foi logo ali aclamado como um herói…


É sabido que “Notícia não é o cão que morde o homem, mas o homem que morde o cão” é uma regra do jornalismo. Pois das minhas memórias enquanto pastor também podia ter sido notícia: Um dia, tendo as cabras no Barroco Salgueiro ou Tejosa de Cima – perto do Fojo – estava a ordenhá-las quando uma delas se desentendeu com a outra que estava ao seu lado e em consequência entornou a lata do leite. Claro que fiquei furioso e, sem pensar um bocadinho, agarrei a cabra (era motcha) pelo pescoço e dei-lhe uma cabeçada…. Foi como se tivesse dado com a cabeça numa fraga. Resultado: sem leite, com dores horríveis e um galo na cabeça. Aquela manhã de Verão foi mesmo para esquecer… Se a Voz do Sino já existisse podia ter dado a notícia “o pastor que marrou na cabra”.

Anónimo disse...

Cala-te ai Teresa Anibal que me fazes crescer agua na
boca .Que saudades eu tenho duma malga de soro
com broa.Tambem eu fui pastora e nunca me envergonhei de dizer que o fui.Obrigado ao Vergilio e
a todos vos pela partilha das vossas historias.VENHAM
MAIS!
Cada vez tenho mais orgulho de ter nascido no
SOBRAL
Um abraco a todos vos.

Goncalvitas....

Anónimo disse...

Pelo parco número de comentários dá-me a sensação que ao contrário de vocês há muitos que devem ter vergonha de contar que foram pastores.

famel disse...

Não acho que tenham vergonha, até porque não à razão nenhuma para ter vergonha...haverá alguma coisa melhor que andar no campo a brincar, com os cheiros e cores da natureza em redor? Vergonha de quê? De ter histórias para contar. Crescer no campo foi a coisa melhor da minha vida.

Anónimo disse...

OH FAMEL TU ÀS VEZES ÉS TÃO INGÉNUA :)
ACREDITA QUE HÁ ALGUNS SOBRALENSES QUE NÃO FAZEM NENHUMA QUESTÃO DE LEMBRAR AS RAÍZES.

Anónimo disse...

oh sobralfilho gostei muito do teu coment. Olha que eu a passar por Cabral e nunca me dei ao trabalho de perguntar à m/ mãe quem era esse personagem ! Deve ter sido mesmo contêmporaneo dos nossos pais. Tal como eu imaginava ,ainda bem que alguém dá provas de que no Sobral há muita estória por descobrir.
Os restantes comentários também são benvindos, até porque quem escreve gosta de críticas sejam elas positivas ou negativas. E como diz o Prof. José Hermano Saraiva a respeito do seu prog. na TV 2: a Alma e a Gente ,"enquanto ouver nem que sejam só 2 espectadores o programa vai continuar a ser feito." E eu que serei um deles.
Agora em tom de brincadeira digo que no Sobral só não foram pastores - nem que fosse só por umas horas - os Padres e as respectivas criadas.

Anónimo disse...

E continuando em tom de brincadeira...,Ó Vrgilio os padres tb são pastores de homens...,já só ficam a faltar as criadas..., eram as pastoras dos padres...tb tinham que guardá-los...Moral da história : mais vale ser pastora que cabra...e sobre "estórias" de pastores, quando tiver vagar conto-vos algumas.

Anónimo disse...

não ,tesanibal pastores são só os bispos porque carregam o báculo-cajado pastoral.
venham lá essa estórias...eu também sei uma: - a do padre Inácio.

Anónimo disse...

desculpa TERESANIBAL não é tesanibal.

Anónimo disse...

corrijo o meu erro: post 5/3 enquanto HOUVER e não- ouver

Anónimo disse...

Olá Gil,
Bem-haja pela tua partilha e dedicação e pela mensagem do teu conto. Ser pastor, trabalhar a terra, ou empregada doméstica, era a sina de quem fazia a quarta classe e não tinha dinheiro para prosseguir os estudos. Para muitos era apenas a espera de outras oportunidades, que com o querer e o desejo de saber, mais tarde conseguiram a concretização dos seus sonhos.
Recordo esse tempo de menina com alguma nostalgia, pois a vida de pastora para mim e para os meus iguais companheiros teve momentos bons e menos bons.
O silêncio dos montes e vales, o chilrear da passarada, levava-nos à reflexão e contemplação da natureza que em todo o ano tem a sua beleza.Fez de nós umas pessoas fortes e sensíveis.Por tudo isto não devemos sentir vergonha desta fase das nossas vidas por que muitos passámos, mas sim orgulhosos de termos encarado aquela fase, como uma forma de nos sentirmos úteis em ajudar os nossos Pais.
A todos os que um dia foram pastores as maiores felicidades.

Anónimo disse...

Por manifesta falta de tempo ainda não te tinha felicitado Virgílio, pois, como sempre, um lindo conto -ou uma realidade - com uma partilha de sentimentos e saberes que de outro modo não seria possível dares.
Se não há mais pastores a falar das suas vivências é porque talvez não saibam como transpor para o papel todas essas emoções.
Por mim, não fui grande pastora... já o disse anteriormente. Lembro-me de dizer à minha avó Ana que não tinha nascido para isso!
Imagine-se a pirralha!
E, na verdade, das únicas duas vezes que guardei cabras, guardei tudo... menos as ditas! Isso deu como resultado, hortas de vizinhos comidas, com os pedidos de muita desculpa da minha avó, que não parava de dizer: - É a bestunta da minha neta, que não é capaz de guardar as cabras, não sei o que vai ela fazer, Deus me acuda!

Serranita disse...

Também eu ainda não tinha felicitado o virgilio, apesar de ter logo lido mais um "conto" que me deliciou. Parabéns, e boa inspiração para os seguintes!