SOBRAL DE SÃO MIGUEL, região demarcada do queijo corno!
quarta-feira, janeiro 18, 2012
Num dia frio e cinzento, protegido pelas encostas do grande Picoto, resiste ao passar do tempo...
47 comentários:
Anónimo
disse...
Aquele é o famoso Monte Cebolo dos documentos antigos com 1418 metros de altitude. Foi marca de fronteira mais de dois séculos entre os Cristãos do Norte e as taifas mouramas do Sul. A origem da palavra tanto pode ser latina, como visogoda, mesmo árabe. Nos topónimos a explicação nem sempre é a mais óbvia. Eu acredito que a maior riqueza mineira de Portugal se encontra nas suas entranhas pois é cruzado por filões de estanho, tungsténio e, decerto, ouro. À superfície, a EDP faz electricidade com o seu vento, os apicultores produzem mel com a flor das suas urzes e outros farão tudo o mais que a boa imaginação e a melhor economia quiserem. Eu apenas descanso por momentos o olhar. asp
Uma pergunta e outro comentário. Aquela belo povoado será o Casal de Santa Teresinha onde eu nunca estive? O comentário é sobre a mudança de cenário. Antigamente, as nossas aldeias serranas escondiam-se agarradas à serra na sua cor. Hoje brilham nesta cor branca. Acho que embelezam o horizonte, como os povoados da Antiga Estremadura que víamos nos manuais de ensino de há cinquenta anos e deve haver alguma prudência no regresso ao escuro xisto. Mas é apenas uma opinião. Não quero ser fundamentalista a não ser nos princípios de bem viver.
Recebi hoje a revista (de publicidade) da Caixa Geral de Depósitos (ano II, 2011, nº 6). Contém um artigo de duas páginas sobre as "aldeias de xisto", com um mapa do qual consta o Sobral. Sobre esta aldeia refere: "No «coração do xisto», encontramos vários moinhos activos, um delicioso queijo corno e uns habitantes locais prontos a contarem «estórias». Ora vamos lá a ver: Quanto aos "moinhos", existem, mas não são os moinhos de vento que o mapa tem desenhado. São moinhos de água, ou azenhas que de facto ainda funcionam. Do "queijo corno", já aqui se escreveu que não parece a ideia mais brilhante para classificar o delicioso queijo de cabra que agora já raramente se consegue encontrar. "Habitantes a contarem «estórias»" seguramente que vai se difícil encontrá-los também. Resta a publicidade feita ao Sobral e que pode constituir o pretexto para que localmente se tomem iniciativas em redor da "marca" "aldeias de xisto". Em lugar de "habitantes a contarem estórias", poderão encontrar, neste blog, informação rica prestada por estudiosos da nossa "história", de que é exemplo máximo o conterrâneo António Santos Pereira. Deste historiador acabei de ler um interessantíssimo livro "Portugal Adentro. Do Douro ao Tejo - O milénio Beirão", no qual são feitas múltiplas referências ao Sobral, enquanto ponto de passagem e linha de fronteira entre o litoral e o interior. AAG
Estou a gostar muito do que leio, façam favor de continuar!
Do Casal, guardo muito boas recordações. Por lá fiquei muitas vezes, a saltar quintais, muros e barrocos, numa infância sem "freio", dividida entre Sobral, Casal de Santa Teresinha e Barrocas do Muro. Melhor, era impossível!
Anda mais perto da verdade o conteúdo do site "aldeias de xisto", de onde retirei o seguinte:
Os seus habitantes denominaram a aldeia como "Coração do Xisto". A relação desta aldeia com o xisto é por demais evidente. E vale a pena descobrir porquê... Mas não só da pedra se construiu esta povoação. Vale a pena vir descobrir os pequenos tesouros que Sobral de S. Miguel esconde. Suba e aprecie paisagens, deslumbre-se. Desça, e refresque-se na sua fonte ou na sua ribeira.
Povoado muito antigo, a sua origem remonta à era romana e esteve sempre associada à Rota do Sal. O seu bairro típico, de arquitectura tradicional, é o Caratão. A ligação com o xisto impõe-se, como atestam as duas pedreiras à porta da aldeia ou o seu típico casario. A fresca e límpida ribeira, que influenciou a construção de diversos açudes, levadas, moinhos e lagares, que merecem ser visitados, banha os pés do aglomerado de casas, correndo num vale talhado de xisto, única rocha existente. A aldeia que sabe e tem gosto em receber o visitante, tem quatro fornos comunitários que continuam a ser muito utilizados pelos seus habitantes. Aqui as pessoas disponibilizam-se para fazer visitas guiadas aos pontos de interesse da aldeia e, se com todo este esforço estiver um pouco cansado, pode sempre beber um pouco de água nos fontanários espalhados pela aldeia.
Espaços comunitários tradicionais Existem alguns espaços físicos comunitários tradicionais, tais como os quatro fornos comunitários, a "eira do povo" (que consiste numa enorme rocha de forma alongada que era utilizada para malhar o milho, o centeio e o trigo), chamada de "Laje". Hoje um lugar de repouso para os mais jovens no Verão, pois fica situada perto da piscina fluvial. Este local é ainda um ponto de encontro nocturno, pois permite a plena observação de estrelas.
Há também quatro moinhos activos espalhados ao longo do curso de água da ribeira.
O valor das coisas raramente está apenas apenas dentro delas, mais estará no valor daquilo que nós nelas pusermos. Nós podemos fazer do Sobral a nossa jóia preciosa, da nossa Beira, o nosso horizonte e de Portugal Inteiro a nossa pátria. O nosso queijo é o melhor para nós e o sabor dele é o que guardamos na memória, pois foram as mãos das nossas mães que o fizeram, talvez também as nossas mãos, que o viraram nas queijeiras, o cheiro que dele vinha, o sabor que ele tinha em janeiro, bem diferente do que teria em Agosto ou Setembro. De facto o nosso queijo não era só "corno", era fresco, era queimoso, até era o queijo "de um filho da mãe", sabia a tudo. Acima, se diz que a nossa rocha única é o xisto. A Geologia é um saber precioso sobre o qual passei ao de leve. Os historiadores tem de saber um pouco de tudo e na observação que faço sobre o assunto em Portugal o que mais me Impressiona são os relevos do duro quartzito (Seixo em vulgar), que cortam Portugal de lés a lés, muito evidentes os segmentos das Portas do Ródão, também em algumas gargantas do Zâzere e em várias linhas no Sobral, onde o xisto domina, mas não é tudo felizmente. asp
Ainda propósito do quartzito, sobre o qual já disse acima, logo a seguir ao queijo com o risco de no futuro quem vier aqui, sem perceber o contexto, vai comer quartzito com queijo, muitos dos que aqui deixam as suas impressões ainda lembram as calçadas de seixo da nossa terra. As ruas da nossa aldeia eram feitas de seixos rolados bem assentes e substituídos pacientemente durante gerações. De facto, antigamente, nada havia de mais apropriado, percebido que além de alguns pés calçados de tamancos, outros, mais bem calçados de botas e botins etc, eram cruzadas pelos rodados de ferro dos carros-de-bois. Como muitos sabem, ja percorri todas as ruas da nossa terra, vai para quarenta/cinquenta anos, todavia, não sei se actualmente ainda sobra alguma relíquia dessa calçada. Se sobrar, que seja, em algum canto ou recanto, apenas um metro, ao faz e desfaz que levou o país à ruína em que se encontra, deixo aqui um veemente pedido aos nossos autarcas que a façam preservar. Voltando ao Casal de Santa Teresinha, onde nunca estive. Pela fotografia, parece-me ser um povoado bem antigo, pelo contorno, talvez um castro lusitano. Sobre o assunto, que falem os arqueólogos, que, decerto, sabem bem mais do que eu. asp.
A designação de"coração do xisto" para o Sobral tem alguma lógica dada a concentração de pedreiras com os seus profundos filões. A grande falha de Portugal com saliências nas Portas de Ródão e no atravessamento do Zêzere em Bogas ,que são verdadeiros monumentos geológicos,tem na margem direita a maior reserva de volfrâmio da Europa e de uma pureza só comparável às reservas da China ,tem ainda esta riqueza-o xisto- a que os nossos empresários se dedicam. Certamente ,um bom tema para um geólogo experiente nos ajudar... FS
Este é um tema difícil, caro FS, e não tem apenas que ver com Geologia. O complexo xistoso em que assenta a nossa aldeia, decerto, em profundidade, rico em filões dos mais ricos minerais metalúrgicos, nunca foi estudado a sério, que eu saiba e a sê-lo que não seja para nosso prejuízo, dado que as riquezas do subsolo pertencem ao Estado e todos sabemos o que aconteceu a S. Jorge da Beira. A mineração, devia ser acompanhada de programas de desenvolvimento. Porém, em quase toda a parte, tem significado abandono, doença etc. asp
Talvez amigo ASP,porque nunca estudámos o nosso território e muito por culpa de não nos ensinarem a pensar, a começar pela Universidade Portuguesa,o escape continue a ser o Fado e a Poesia ,neste jardim à beira mar plantado. No entanto,a passagem de povos pela Ibéria e,em particular os Romanos,deixaram-nos lições que não soubemos interiorizar e valorizar como melhor sabes do que eu. fs
Amigo FS, sempre houve estudiosos e tu sabes que alguns palmilharam o país de lés a lés, por exemplo, a equipa do ilustre Orlando Ribeiro. Eu percorri a documentação concernente a todo o país e fiz um mapa original do revestimento arbóreo no século XVI e não me posso queixar dos apoios do nosso Estado. Parcos, mas suficientes, para quem viveu sempre de forma austera. Aliás, até penso, que não é por falta de dinheiro que não se fazem as coisas. Em alguns, há uma certa preguiça milenar a que só é posto fim quando há ameaças, mais sérias, como foi com os romanos em que talvez os habitantes daquele Castro, agora dito Casal de Santa Teresinha foram obrigados a vir trabalhar em alguma exploração agrícola romana, para Casegas ou talvez para o Ourondo ou outro lugar qualquer, que eu não tenho provas, estou apenas ao nível das hipóteses, e deixaram a economia de recoleccão em que viviam. Quanto ao fado e à poesia, todos os povos têm o seu fado e os seus poetas. Quando estes acabam, acabam os povos. Precisamos tanto da poesia como da água que bebemos, caro FS. E que somos nós senão poetas quando deixamos aqui estas ideias? asp
A propósito de "habitantes a contarem estórias" antigas, apenas me lembro do "Ti" Alberto Abrantes que muito estimo pelo exemplo de saudável convívio e de trabalho conjunto na nossa IPSS.Entre os falecidos ,vêm-me à memória vários conterrâneos,desde vizinhos populares até aos mais eruditos e familiares. Sobre a minha questão anterior amigo ASP,quero referir-me a académicos que não têm o teu estatuto (guardo a tua tese de doutoramento e sobre a qual consulto muitas vezes)enquanto do mestre Orlando Ribeiro,pai da geografia moderna,também guardo diversos livros ,designadamente, Os Opúsculos Geográficos.Aliás ,conheço pessoalmente pessoas da sua "escola" e é aí que eu quero chegar. Congratulo-me e partilho da amizade de muito sobralenses,mais populares ou mais estudiosos,e guardo boas e verdadeiras recordações do Sobral (desde a nossa carteira na escola da Eira). fs
Caro FS Não há dúvida que a escola da Eira, faz decisivamente parte da nossa epopeia. Ela foi o ponto de partida,o nosso porto do restelo, numa viagem à Índia, de que não sabemos o fim. Mas, agora, volto, antes a descansar o olhar no Casal de Santa Teresinha, aquela colina do princípios dos tempos, onde decerto os primeiros homens do noso passado remoto, naturalmente, se protegiam dos animais selvagens e de outros homens. Não tenho dúvidas que estamos perante um dos monumentos naturais de maior interesse na vertente sul do Cebolo.
Penso que o comentário anterior seja do ASP,e neste caso cumpre-me discordar da situação geográfica que ele atribui ao do Casal de Sta.Teresinha.Não é a sul do Cebolo mas a Norte,e mais precisamente a Nordeste. Assim como S. Jorge está a Sueste do mesmo Picoto.
Claro que o comentário anterior é do asp e ele queria dizer que o Casal de Santa Teresinha, aquela jóia que pertence à Freguesia de S. Jorge da Beira e que antes devia pertencer à de Sobral de S. Miguel, vamos abrir negociações para a cedência, ou para um referendo à poplação, fica na vertente Sul da Cordilheira Central, que corta Portugal a meio, Norte/Sul, desde a Malcata, pela Estrela, o Cabeço do Gondufo, as nossa Águas Ceiras e o do Açor, o cabeço do Cebolo, e a Serra da Lousã, Serra d'Aire, Montejunto e Sinta, quis abreviar mas mantenho, caro Virgílio, estimado amigo, vertente sul do Cebolo, que é para sul, que aqui as águas correm. asp
Eu peço desculpa pela inúmeras gralhas que qualquer fundamentalista apanhe nestes meus textes. São escritos em velocidade, depois releio e as falhas são tantas que me envergonho deles. Por exemplo, onde consta poplação, obviamente queria escrever população. Se alguém, algum dia, protestar, deixarei de escrever aqui, e será menos um a aborrecer-vos ou a gralhar-vos. asp
asp,geograficamente falando,eu tenho razão.Basta conferir as coordenadas dos pontos em questão. No entanto abdico de abrir aqui um fórum de discução a dois.4 anos da minha diáspora(peregrinação)foram passados a trabalhar em topografia e 43 semanas dos meus primeiros vinte anos a desenhar casas e mapas.Assim como as 43 semanas seguintes foram passadas debaixo da terra (em parte do Picoto) a furar o duro basalto que aloja a leitosa brancura do quartzo que contém as "pintas" negras do volfrâmio agora dito Tungsténio e as doiradas pepitas da pirite,também dito ouro dos tolos.
Caro Virgílio, se bem te lembras, há uma idade, em que dizemos que já temos razão, ou seja sabemos discernir entre o bem e o mal, encontramos a ordem ou sentido das coisas, compreendemo-las. em alguns casos com conhecimentos ditos científicos. Na História da Humanidade, também se invocou uma Idade da Razão. Depois pensou-se que ela tudo resolvia e entrou-se num ismo dito racionalismo. Afinal, descobriu-se que o homem, mesmo os mais sábios raramente conseguem conduzir a sua vida pela razão, que todos invocamos ter e os povos ainda menos, a Idade da Razão em nome dela trouxe guerra e mais querra etc. Obviamente os minutos que passamos por aqui, são para dar descanso à razão de termos de fazer trabalhos de que racionalmente vivemos e eu não me importo de perder a razão pelas coordenadas geográficas, e de ganhá-la pela amizade, mas explico-me, para que me entendam, não tu que já me entendeste, as águas que passam junto ao casal correm para a bacia do Tejo, a sul, as que descem a outra vertente vão para o Ceira e para a Bacia do Mondego, embora algumas sejam aproveitadas por túnel para a barragem de Santa Luzia e, portanto, também para a Bacia do Tejo. Agora, mais racionalmente, vou continuar a escrever sobre os Cistercienses em Portugal. asp
Pois claro que a disposição deste pequeno lugar nos leva a imaginação para outros tempos ditos da Idade do Ferro. E é realmente possivel que tenha sido um pequeno castro a "pairar" sobre o resto do vale, contudo é mais a baixo que encontramos vestigios que nos remontam para esse tempo. Mais acima do "Descalço" existe um pequeno cabeço rodeado por uma pequena muralha, hoje não é visivel tantas são as giestas, silvas e gravetos que a cobrem. Contudo após o incêndio de 2001 o cabeço estava limpo e olhei para ela com satisfação tal, que me mandei a correr pela descida na sua direcção e só parei quando os bofes quase me saiam pela boca!!! Olhei, olhei e olhei, mas os meus olhos ainda eram olhos de estudante do 11º ano que sabia umas coisitas de arqueologia, portanto muita coisa me deve ter passado despercebida. Já mais tarde por volta de 2003 voltei lá e lá descobri mais umas coisas, uns vestigios de escoria e uns buracos de poste, que juntando às gravuras encontradas em muitas lajes e mamoas do nosso Açôr levam-nos a crer que muitos bravos por aqui tenham vivido! Não esquecer que a nossa serra é rica em estanho, e os romanos farejavam-no a milhas, portanto também devem ter passado por aqui sem que no entanto se tenham fixado.
Bem, que tenho agora a confirmação da nossa arqueóloga, Aquela colina,assim, como aparece na fotografia, agora cheia de casas brancas, decerto foi encimada por um castro. Basta saber olhar. O castro que conheço melhor é o do Zambujal perto de Torres Vedras, quem for para a Praia de Santa Cruz, pode ir espreitar como viviam os homens há três mil anos. Este nosso mais elevado devia aproximar-se do modelo dos do Norte do País de que conhecemos o da citânia de Briteiros. asp
Estive no Casal pela primeira vez creio,já de adulto. Partilho a ideia de um castro pela configuração da encosta/colina além de estar rodeada de montanha em semi-arco,logo em posição de defesa. Será ,com certeza,o povo mais antigo daquele vale. fs
Caro FS, Falamos aqui de uma anexa de S. Jorge da Beira com tanto empenho e ninguém desta freguesia ou daquele belo, embora pequeno, povoado, decerto, com mais de três mil anos, vem aqui dizer qualquer coisa, nem sequer na forma anónima, que este blogue permite. asp
Pois é,amigo ASP,não fazemos rede do saber e os nossos vizinhos de São Jorge e alguns ,sendo nossos amigos/conhecidos,bem podiam dar a sua versão.Aliás,o blogue deles pode dar um contributo...Um problema como muitos..., deste País. fs
A vista da belíssima Serra, do lado do Picoto, mas também a do lado do Cabeço da Nave (Sobral), suscita-me uma interrogação que os conterrâneos dedicados à agronomia (o meu primo Francisco) ou à História (o amigo António Pereira) ou outros poderiam responder: porque razão existem baldios do lado de lá da Serra e não existe um único baldio do lado de cá? Como leigo, imputaria isso à maior ocupação da serra que existiu deste lado, de tal modo que houve a necessidade de cada um se ir apropriando do seu bocado de terra. Mas porventura existirão outras explicações mais exactas que desconheço ligadas a factores históricos: ocupação, concessão, etc. Uma coisa é certa: parece que toda a serra do nosso lado até à vertente, está dividida em parcelas, ao passo que do lado de lá, a partir da estrada, o terreno é baldio (tendo servido para apascentar o gado, cortar lenhas e mato, pelos respectivos "fregueses"). AAG
Meus caros amigos, Sobre a questão colocada pelo nosso conterrâneo, AAG, também me tenho interrogado sobre a não existência de baldios nas extensas testadas do “nosso” Cabeço d’A Nave. E a aguardava uma oportunidade para a colocar aqui no blogue. Sobre esta questão, lembro-me do meu avô, João Pereira Marques (1874-1965) de contar que houve “lutas “ ou reuniões onde o pessoal do Sobral terá exigido que quem fosse dono dos “baixos” seriam também dono dos “altos”. Ou seja, do nível dos ribeiros/valados, até ao cimo dos montes: Águas-vertentes. E então a palavra de ordem era “Altos e baixos”. Notava que o meu avô ao falar neste assunto, deixava transparecer um certo orgulho e dava a entender que o facto de no Sobral não haver baldios não teria sido fácil. Eu, como catraio, certamente com outras preocupações, não explorei o assunto pelo que não sei onde, nem quando foram feitas essas negociações. Como sabemos, naqueles tempos, poucos sabiam escrever. Valia a palavra dada e depois o “costume”. Também se contava que para a escolha dos indivíduos que governavam o Concelho da Covilhã, os homens do Sobral teriam que se dirigir à Igreja de Unhais da Serra para poderem votar. E a Fonte da ponte ou a própria Ponte parece ter sido resultado duma promessa feita por um desses eleitos. Contava também o meu avô que um dia marcado para a realização de uma dessas eleições teriam sido avisados para se rodearem de todas as cautelas pois os “Unhadenses” queriam fazer-lhes uma cilada para darem porrada na malta. Sendo a fonte de informação fidedigna (o aviso foi dado pelo Pároco, natural de Unhais, que nessa data paroquiava o Sobral), a malta do Sobral avançou sem medo, mas por outro caminho. Os Unhadenses fartos de esperar regressaram a Unhais e já os nossos antepassados tinham cumprido o seu dever de votar e claro, já não houve luta.
A figura dos baldios (terrenos de uso comum, designadamente para apascentar gado, cortar lenha ou mato) perde-se nos confins dos tempos, mas ainda nos nossos dias tem consagração legal. É uma forma específica de propriedade que, em vez de ser individual ou em regime de compropriedade,é colectiva ou comunitária). Pese embora as mudanças que ocorreram, ainda hoje os baldios têm um regime jurídico próprio,sendo administrados por uma Comissão. Além disso, os terrenos baldios não podem ser objecto de apropriação privada, não podendo ser objecto de negociação. Nas campanhas de florestação que ocorrerem no Estado Novo, houve a tentativa de o Estado se apropriar dos baldios, transformando-os em terrenos do domínio público estadual)bem diferente do regime comunitário). Essas tentativas tiveram algum sucesso, mas defrontaram-se também com enorme oposição das populações que se viram desapropriadas de terrenos que podiam usar livremente (dentro do condicionalismo dos baldios). O escritor Aquilino Ribeiro retrata essa época em diversos romances, entre os quais "Quando os Lobos Uivam". Mas nada disto responde à pergunta: por que razão não existem baldios no Sobral, em S. Jorge ou em Casegas, mas já existem nas Cortes de Cima ou em Unhais da Serra e mais ainda na Teixeira? Outro aspecto que me parece curioso, agora em sentido inverso, é o facto de os fornos serem comunitários (coisa diversa de pertencerem à Junta de Freguesia). Trata-se de uma realidade bem diversa dos moinhos e dos antigos lagares: estes não eram nem comunitários nem públicos, antes pertenciam ou pertencem, em regime de compropriedade, aos diversos donos, sendo a proporção do direito formada, no que respeita aos moinhos, pelos dias de uso privativo. AAG
A figura dos baldios (terrenos de uso comum, designadamente para apascentar gado, cortar lenha ou mato) perde-se nos confins dos tempos, mas ainda nos nossos dias tem consagração legal. É uma forma específica de propriedade que, em vez de ser individual ou em regime de compropriedade,é colectiva ou comunitária). Pese embora as mudanças que ocorreram, ainda hoje os baldios têm um regime jurídico próprio,sendo administrados por uma Comissão. Além disso, os terrenos baldios não podem ser objecto de apropriação privada, não podendo ser objecto de negociação. Nas campanhas de florestação que ocorrerem no Estado Novo, houve a tentativa de o Estado se apropriar dos baldios, transformando-os em terrenos do domínio público estadual)bem diferente do regime comunitário). Essas tentativas tiveram algum sucesso, mas defrontaram-se também com enorme oposição das populações que se viram desapropriadas de terrenos que podiam usar livremente (dentro do condicionalismo dos baldios). O escritor Aquilino Ribeiro retrata essa época em diversos romances, entre os quais "Quando os Lobos Uivam". Mas nada disto responde à pergunta: por que razão não existem baldios no Sobral, em S. Jorge ou em Casegas, mas já existem nas Cortes de Cima ou em Unhais da Serra e mais ainda na Teixeira? Outro aspecto que me parece curioso, agora em sentido inverso, é o facto de os fornos serem comunitários (coisa diversa de pertencerem à Junta de Freguesia). Trata-se de uma realidade bem diversa dos moinhos e dos antigos lagares: estes não eram nem comunitários nem públicos, antes pertenciam ou pertencem, em regime de compropriedade, aos diversos donos, sendo a proporção do direito formada, no que respeita aos moinhos, pelos dias de uso privativo. AAG
Passei ontem o meu tempo em trabalho intenso e só hoje noto como os meus amigos do Sobral se interessaram por uma matéria extraordinariamente interessante para qualquer historiador que se queira digno do nome. Para se ser digno do nome deve-se seguir no tempo longo a evolução das instituições, sustentado em documentos, para notar os cortes nas tradições, por factos legais, revolucionários ou outros. Já o fiz para a Ilha de S. Jorge e aí até é possível perceber como havia delimitações entre as terras senhoriadas e as baldias, reservadas ao pastoreio e ao fornecimento de lenhas e outros recursos aos que deles necessitassem, respeitando certas regras impostas a nível concelhio, geralmente conhecidas pelas designação de posturas municipais. De facto, toda a tradição oral que o nosso Sobral Filho apresenta também merece atenção, porém, há um facto histórico a que aqui já tenho apelado e que está sustentado nas chancelarias da Ordem de Cristo, que resolve em parte o problema. O território do Sobral, de S. Jorge, de Casegas, de Relvas, Silvares, Bogas, S. Martinho, Enxabarda e Castelejo, fazia todo parte da Comenda de Nossa Senhora da Silva do Castelejo, e os foreiros, sujeitos à dízima à Ordem e à redízima ao comendatário, lavradores, caseiros etc, beneficiavam de um estatuto especial dentro do concelho. Houve conflitos longos entre as autoridades concelhias e aqueles nos seu conjunto porque os nossos antepassados sempre invocaram que não deviam participar com trabalho nas obras concelhias, por exemplo na construção das calçadas da Covilhã, por serem privilegiados da Ordem. Este facto não é de somenos importância e aqui, fica a minha memória, ao sangue derramado. Quando as ordens e as comendas foram extintas com a revolução liberal, as terras das comendas, foram resgatadas pelos foreiros, ainda que com algumas liberdades de pastagens comuns em algumas partes que resultaram em conflitos graves. Pelo que a evolução normal foi para a propriedade plena que os liberais sempre defenderam. Onde a autoridade concelhia tinha tutela mantiveram-se os baldios, casos da Erada, Unhais, etc. O caso relatado por Aquilino e que lhe trouxe problemas no fim da vida abordei-o em «Aquilino Ribeiro, ao caleidoscópio, entre Paris, por Lisboa e a Beira Profunda», in Letras Aquilianas, n.º 1, 2007, pp. 37-67.
Caro António Pereira A explicação que dás tem toda a lógica e, aliás, já a retirara do teu livro Portugal Adentro, onde abordas a matéria da Comenda da Ordem de Cristo. Compreende-se que, depois, com a revolução liberal, os terrenos que eram agricultados pelos foreiros, tivessem sido resgatados, ficando a pertencer-lhes em propriedade plena. Apesar disso, não deixa de ser estranho que toda a serra, onde nem sequer havia pinheiros ou outras árvores, tivesse sido apropriada, tanto mais que da Cabrieira para cima nem sequer existe terra arável. Na minha posição de leigo, encontro uma razão plausível no número de pessoas que, apesar de tudo (sobre)viviam no Sobral, e, porque não dizê-lo, talvez num excessivo individualismo, determinado pela necessidade. Com efeito, tendo em conta a actividade principal da pastorícia, seria mais adequado á sobrevivência de toda uma população a existência de baldios onde cada um, de acordo com as suas possibilidades ou necessidades, pudesse pastorear os rebanhos. Bem sabemos como, até à década de 70, era "perigosa" a ideia de roçar mato na propriedade do vizinho ou entrar com as cabradas em propriedade alheia ... AAG
Caro AAG Sem muito trabalho de arquivo ficamos com muita escuridão quando olhamos a realidade. Um dos vícios estruturais do historiador é só descobrir a realidade depois de a ter encontrado no Arquivo. Passei milhares de vezes junto à ribeira da Líria em Castelo Branco e só a percebi quando a encontrei em documento de arquivo. Quanto à nossa serra, e a uma eventual questão de baldio, ideia perigosa depois do triunfo do ideário liberal, para além de perceber a ancestral tutela da Ordem do Templo/Cristo, que nos deve honrar a todos como descendentes dos lavradores da mesma,pois foi ela que liderou grande do esforço inicial de descoberta do Mundo, falta o estudo dos processos concretos que ao longo so século XIX, deram no apropriamento da mesma, embora com os direitos de pastoreio colectivo nos cimos escalavados dos montes. O Sobral filho apela à tradição e de facto minha mãe também me falava dos inúmeros rebanhos que atravessavam o sobral a caminho daquela. Também tens razão que os rebanhos expulsavam as gentes e que a multiplicação destas exigiu todo o recanto, mesmo os cimos dos montes, para prouzir pão. Eu ainda sou testemunha das searas de centeio, no cimo destes e depois dos milheirais onde houvesse um pingo de água. asp
Quem de Castelo Branco viajar para a Covilhã ou vice-versa olhe Castelo Novo e perceberá o Casal de Santa Teresinha. A fronteira Norte/Sul esteve aqui mais tempo do que além. Só que o granito resiste mais ao desgaste do tempo do que o xisto, daí aquele ar mais arcaico de Castelo Novo, dita aldeia histórica. Mas aqui, junto de nós, tudo é mais majestoso.O cebolo tem mais 500 metros do que a Gardunha que protege aquele, os vales aqui são bem mais fundos e protegiam bem mais das investidas da Mourama ou da Cristandade, depende da perspectiva em que cada um se colocar. Com a multiculturalidade, já se imaginaram numa sala de aula com cristãos, muçulmanos, budistas, etc. asp
Estou orgulhosa com os participantes do nosso blo. Cada vez que por aqui passo saio mais rica em conhecimentos. Não tenho tido muito tempo para ler tudo, apesar de achar que todos os temas e comentários são muito interessantes. Fico surpreendida com toda a história que envolveu o nosso Distrito, incluindo o nosso Sobral, suas gentes, e os seus vales e montes. Adorei tudo o que se falou aqui sobre a história do João Brandão, e das lutas dos liberais. Em relação aos baldios e também porque fui pastora,não me recordo deles a não ser do medo que eu tinha de deixar passar uma cabra para a floresta que começava no alto da serra do meu carvalhal e carvalho. Agradeço aos nossos sabedores da matéria pelo facto de aqui partilharem seus conhecimentos.
Caro ASP: fiquei esclarecido sobre o ponto de vista histórico e como foi determinante a Ordem do Templo/Cristo ,na ocupação/exploraçâo do espaço do território - ausência de baldios no Sobral e em São Jorge da Beira. Há quem advogue que os baldios se circunscreveram a norte do sistema montanhoso Montejunto-Estrela e que se deve à influência da presença dos mouros no território nacional. Como sabes,a implementação deste processo deu azo a vicissitudes e lutas,e porque não, alguma sagacidade e visão dos nossos antepassados creio,no século dezanove,como refere um anónimo anterior(talvez na época da criação das aldeias civis em 1880 o Sobral e no ano anterior São Jorge). Os pastos para o gado ,as lenhas e o carvão para o aquecimento ,associado ao crescendo da indústria dos lanifícios na cidade da covilhâ,desenvolveu a actividade dos carvoeiros e a concorrência com os de Cortes do Meio. fs
Caro fs, Não creio que os baldios tenham a ver com a mourama. O Prof. José Mattoso defende um sentido mais comunitário nas populações do Nordeste Montanhoso Português, acima do dito sistema. As dificuldades da sobrevivência impunham-no e, de facto, é assim. Mas só Deus e os valores que ele representa de amor, justiça, paz,tranquilidade e sabedoria, são eternos. O resto tudo muda, até aquele bom sentido comunitário e não são raros os mais graves crimes em tais partes. asp asp
Começo por corrigir a data da elevação a freguesia civil que é 1888 para o Sobral,separando-se de Casegas como sabemos. Sobre a tese do Prof.José Matoso também me parece mais verdadeira com a história e o espírito comunitário das populações a norte do Tejo. Sobre a forma de exploração do território, além dos baldios e dos privados,há ainda as associações de compartes(Teixeira) e as autarquias(Alvoco da Serra, Cortes do Meio)-Juntas de Freguesia ditas ricas e outras sem património(Sobral).Aliás,um antepassado e autarca do Sobral ,contava que numa visita de alguém importante da Câmara da Covilhã lhe perguntou sobre os rendimentos e terrenos da Junta de Freguesia e a resposta não se fez esperar " que no Sobral havia apenas os Fragões da Eira da Ponte do Lugar como terrenos da Freguesia e a Eira da Ponte comunitária" para a malha dos cereais.Claro que temos também quatro fornos comunitários. fs
A diversidade da vida é tão grande que, para além dos diversos tipos de propriedade que já foram referidos (propriedade plena, compropriedade de lagares e moinhos, domínio público da junta de freguesia e baldios), ainda existe uma particularidade nas aldeias do interior, incluindo no Sobral, que são as chamadas "oliveiras do senhor". Ou seja, árvores cujas azeitonas serviam para arranjar azeite para as lamparinas (no tempo em que ainda se usava azeite), pertencendo à Igreja (ou melhor à paróquia ou à Fábrica da Igreja) que tanto pode ser proprietária do terreno e da oliveira como apenas proprietária da oliveira. Neste último caso, em termos jurídicos, já não estamos verdadeiramente a falar de propriedade, mas de um "primo" que se chama "direito de superfície" em que o terreno pertence a uma pessoa e a árvore a outra. AAG
Caro AAG,Ainda me lembro do nosso tempo da escola e catequese em que em algumas tardes de Domingo(PELA BOA CAUSA NÃO ERA PECADO)íamos "voluntáriamente" a pedido das catequistas apanhar azeitonas do Senhor nas oliveiras por baixo da Escola. Aproveito a ocasião para remover uma dúvida:-no caso das oliveiras não é mais correcto dizer "uso fruto" e "direito de superfície" para os imóveis?
Caro AAG Volto ao sentido de propriedade que o liberalismo desenvolveu e que de facto pretendeu eliminar esses diversos tipos de tenência da terra ou outros bens na forma antiga, que geralmente era de direito de uso e melhoria dos mesmos e de transmissão "melhorados e não piorados" aos vindouros. Mesmo o rei assim devia fazer em relação ao reino que recebia e devia transmitir ao herdeiro. Agora quanto às oliveiras do Senhor, geralmente resultam de doações em verba testamentária. Há muita documentação nas confrarias que informa sobre estas doações e as respectivas condições em que foram feitas, impondo, em alguns casos, missas pela alma. Na nossa terra, são poucas, porque somos todos apenas remediados e uma ou duas oliveiras eram sempre muito importantes, mas em freguesias de gente mais rica, esta salvava a alma ricamente, decerto, depois de também muitos mais "ricos" pecados.
47 comentários:
Aquele é o famoso Monte Cebolo dos documentos antigos com 1418 metros de altitude. Foi marca de fronteira mais de dois séculos entre os Cristãos do Norte e as taifas mouramas do Sul. A origem da palavra tanto pode ser latina, como visogoda, mesmo árabe. Nos topónimos a explicação nem sempre é a mais óbvia. Eu acredito que a maior riqueza mineira de Portugal se encontra nas suas entranhas pois é cruzado por filões de estanho, tungsténio e, decerto, ouro. À superfície, a EDP faz electricidade com o seu vento, os apicultores produzem mel com a flor das suas urzes e outros farão tudo o mais que a boa imaginação e a melhor economia quiserem. Eu apenas descanso por momentos o olhar.
asp
Uma pergunta e outro comentário. Aquela belo povoado será o Casal de Santa Teresinha onde eu nunca estive? O comentário é sobre a mudança de cenário. Antigamente, as nossas aldeias serranas escondiam-se agarradas à serra na sua cor. Hoje brilham nesta cor branca. Acho que embelezam o horizonte, como os povoados da Antiga Estremadura que víamos nos manuais de ensino de há cinquenta anos e deve haver alguma prudência no regresso ao escuro xisto. Mas é apenas uma opinião. Não quero ser fundamentalista a não ser nos princípios de bem viver.
para não haver confusão, o comentário anterior é do
asp
Passando pelo o blog de S.Jorge da Beira acho que se pode confirmar que é bem o Casal...
Recebi hoje a revista (de publicidade) da Caixa Geral de Depósitos (ano II, 2011, nº 6).
Contém um artigo de duas páginas sobre as "aldeias de xisto", com um mapa do qual consta o Sobral.
Sobre esta aldeia refere: "No «coração do xisto», encontramos vários moinhos activos, um delicioso queijo corno e uns habitantes locais prontos a contarem «estórias».
Ora vamos lá a ver:
Quanto aos "moinhos", existem, mas não são os moinhos de vento que o mapa tem desenhado. São moinhos de água, ou azenhas que de facto ainda funcionam.
Do "queijo corno", já aqui se escreveu que não parece a ideia mais brilhante para classificar o delicioso queijo de cabra que agora já raramente se consegue encontrar.
"Habitantes a contarem «estórias»" seguramente que vai se difícil encontrá-los também.
Resta a publicidade feita ao Sobral e que pode constituir o pretexto para que localmente se tomem iniciativas em redor da "marca" "aldeias de xisto".
Em lugar de "habitantes a contarem estórias", poderão encontrar, neste blog, informação rica prestada por estudiosos da nossa "história", de que é exemplo máximo o conterrâneo António Santos Pereira.
Deste historiador acabei de ler um interessantíssimo livro "Portugal Adentro. Do Douro ao Tejo - O milénio Beirão", no qual são feitas múltiplas referências ao Sobral, enquanto ponto de passagem e linha de fronteira entre o litoral e o interior.
AAG
Estou a gostar muito do que leio, façam favor de continuar!
Do Casal, guardo muito boas recordações. Por lá fiquei muitas vezes, a saltar quintais, muros e barrocos, numa infância sem "freio", dividida entre Sobral, Casal de Santa Teresinha e Barrocas do Muro.
Melhor, era impossível!
René Déscartes adaptado:
Penso, logo existo.
Existo, logo penso.
Xisto, logo existo.
Existo, logo xisto.
Existo, xisto, isto.
Anda mais perto da verdade o conteúdo do site "aldeias de xisto", de onde retirei o seguinte:
Os seus habitantes denominaram a aldeia como "Coração do Xisto". A relação desta aldeia com o xisto é por demais evidente. E vale a pena descobrir porquê... Mas não só da pedra se construiu esta povoação. Vale a pena vir descobrir os pequenos tesouros que Sobral de S. Miguel esconde. Suba e aprecie paisagens, deslumbre-se. Desça, e refresque-se na sua fonte ou na sua ribeira.
Povoado muito antigo, a sua origem remonta à era romana e esteve sempre associada à Rota do Sal. O seu bairro típico, de arquitectura tradicional, é o Caratão. A ligação com o xisto impõe-se, como atestam as duas pedreiras à porta da aldeia ou o seu típico casario.
A fresca e límpida ribeira, que influenciou a construção de diversos açudes, levadas, moinhos e lagares, que merecem ser visitados, banha os pés do aglomerado de casas, correndo num vale talhado de xisto, única rocha existente.
A aldeia que sabe e tem gosto em receber o visitante, tem quatro fornos comunitários que continuam a ser muito utilizados pelos seus habitantes. Aqui as pessoas disponibilizam-se para fazer visitas guiadas aos pontos de interesse da aldeia e, se com todo este esforço estiver um pouco cansado, pode sempre beber um pouco de água nos fontanários espalhados pela aldeia.
Espaços comunitários tradicionais
Existem alguns espaços físicos comunitários tradicionais, tais como os quatro fornos comunitários, a "eira do povo" (que consiste numa enorme rocha de forma alongada que era utilizada para malhar o milho, o centeio e o trigo), chamada de "Laje". Hoje um lugar de repouso para os mais jovens no Verão, pois fica situada perto da piscina fluvial. Este local é ainda um ponto de encontro nocturno, pois permite a plena observação de estrelas.
Há também quatro moinhos activos espalhados ao longo do curso de água da ribeira.
Para mim sempre "queijo corno"!!!!
Para mim; e' queijo cabreiro.
Nao o como, e nao o veijo
ai que saudade!!!!
O valor das coisas raramente está apenas apenas dentro delas, mais estará no valor daquilo que nós nelas pusermos. Nós podemos fazer do Sobral a nossa jóia preciosa, da nossa Beira, o nosso horizonte e de Portugal Inteiro a nossa pátria. O nosso queijo é o melhor para nós e o sabor dele é o que guardamos na memória, pois foram as mãos das nossas mães que o fizeram, talvez também as nossas mãos, que o viraram nas queijeiras, o cheiro que dele vinha, o sabor que ele tinha em janeiro, bem diferente do que teria em Agosto ou Setembro. De facto o nosso queijo não era só "corno", era fresco, era queimoso, até era o queijo "de um filho da mãe", sabia a tudo. Acima, se diz que a nossa rocha única é o xisto. A Geologia é um saber precioso sobre o qual passei ao de leve. Os historiadores tem de saber um pouco de tudo e na observação que faço sobre o assunto em Portugal o que mais me Impressiona são os relevos do duro quartzito (Seixo em vulgar), que cortam Portugal de lés a lés, muito evidentes os segmentos das Portas do Ródão, também em algumas gargantas do Zâzere e em várias linhas no Sobral, onde o xisto domina, mas não é tudo felizmente.
asp
Quero dizer Zêzere, que significa, porventura, numa língua muito antiga Rio do Ouro, que de facto tinha.
asp
Ainda propósito do quartzito, sobre o qual já disse acima, logo a seguir ao queijo com o risco de no futuro quem vier aqui, sem perceber o contexto, vai comer quartzito com queijo, muitos dos que aqui deixam as suas impressões ainda lembram as calçadas de seixo da nossa terra. As ruas da nossa aldeia eram feitas de seixos rolados bem assentes e substituídos pacientemente durante gerações. De facto, antigamente, nada havia de mais apropriado, percebido que além de alguns pés calçados de tamancos, outros, mais bem calçados de botas e botins etc, eram cruzadas pelos rodados de ferro dos carros-de-bois. Como muitos sabem, ja percorri todas as ruas da nossa terra, vai para quarenta/cinquenta anos, todavia, não sei se actualmente ainda sobra alguma relíquia dessa calçada. Se sobrar, que seja, em algum canto ou recanto, apenas um metro, ao faz e desfaz que levou o país à ruína em que se encontra, deixo aqui um veemente pedido aos nossos autarcas que a façam preservar.
Voltando ao Casal de Santa Teresinha, onde nunca estive. Pela fotografia, parece-me ser um povoado bem antigo, pelo contorno, talvez um castro lusitano. Sobre o assunto, que falem os arqueólogos, que, decerto, sabem bem mais do que eu.
asp.
A designação de"coração do xisto" para o Sobral tem alguma lógica dada a concentração de pedreiras com os seus profundos filões.
A grande falha de Portugal com saliências nas Portas de Ródão e no atravessamento do Zêzere em Bogas ,que são verdadeiros monumentos geológicos,tem na margem direita a maior reserva de volfrâmio da Europa e de uma pureza só comparável às reservas da China ,tem ainda esta riqueza-o xisto- a que os nossos empresários se dedicam.
Certamente ,um bom tema para um geólogo experiente nos ajudar...
FS
Este é um tema difícil, caro FS, e não tem apenas que ver com Geologia. O complexo xistoso em que assenta a nossa aldeia, decerto, em profundidade, rico em filões dos mais ricos minerais metalúrgicos, nunca foi estudado a sério, que eu saiba e a sê-lo que não seja para nosso prejuízo, dado que as riquezas do subsolo pertencem ao Estado e todos sabemos o que aconteceu a S. Jorge da Beira. A mineração, devia ser acompanhada de programas de desenvolvimento. Porém, em quase toda a parte, tem significado abandono, doença etc.
asp
Talvez amigo ASP,porque nunca estudámos o nosso território e muito por culpa de não nos ensinarem a pensar, a começar pela Universidade Portuguesa,o escape continue a ser o Fado e a Poesia ,neste jardim à beira mar plantado.
No entanto,a passagem de povos pela Ibéria e,em particular os Romanos,deixaram-nos lições que não soubemos interiorizar e valorizar como melhor sabes do que eu.
fs
Amigo FS,
sempre houve estudiosos e tu sabes que alguns palmilharam o país de lés a lés, por exemplo, a equipa do ilustre Orlando Ribeiro. Eu percorri a documentação concernente a todo o país e fiz um mapa original do revestimento arbóreo no século XVI e não me posso queixar dos apoios do nosso Estado. Parcos, mas suficientes, para quem viveu sempre de forma austera. Aliás, até penso, que não é por falta de dinheiro que não se fazem as coisas. Em alguns, há uma certa preguiça milenar a que só é posto fim quando há ameaças, mais sérias, como foi com os romanos em que talvez os habitantes daquele Castro, agora dito Casal de Santa Teresinha foram obrigados a vir trabalhar em alguma exploração agrícola romana, para Casegas ou talvez para o Ourondo ou outro lugar qualquer, que eu não tenho provas, estou apenas ao nível das hipóteses, e deixaram a economia de recoleccão em que viviam. Quanto ao fado e à poesia, todos os povos têm o seu fado e os seus poetas. Quando estes acabam, acabam os povos. Precisamos tanto da poesia como da água que bebemos, caro FS. E que somos nós senão poetas quando deixamos aqui estas ideias?
asp
A propósito de "habitantes a contarem estórias" antigas, apenas me lembro do "Ti" Alberto Abrantes que muito estimo pelo exemplo de saudável convívio e de trabalho conjunto na nossa IPSS.Entre os falecidos ,vêm-me à memória vários conterrâneos,desde vizinhos populares até aos mais eruditos e familiares.
Sobre a minha questão anterior amigo ASP,quero referir-me a académicos que não têm o teu estatuto (guardo a tua tese de doutoramento e sobre a qual consulto muitas vezes)enquanto do mestre Orlando Ribeiro,pai da geografia moderna,também guardo diversos livros ,designadamente, Os Opúsculos Geográficos.Aliás ,conheço pessoalmente pessoas da sua "escola" e é aí que eu quero chegar.
Congratulo-me e partilho da amizade de muito sobralenses,mais populares ou mais estudiosos,e guardo boas e verdadeiras recordações do Sobral (desde a nossa carteira na escola da Eira).
fs
Caro FS
Não há dúvida que a escola da Eira, faz decisivamente parte da nossa epopeia. Ela foi o ponto de partida,o nosso porto do restelo, numa viagem à Índia, de que não sabemos o fim. Mas, agora, volto, antes a descansar o olhar no Casal de Santa Teresinha, aquela colina do princípios dos tempos, onde decerto os primeiros homens do noso passado remoto, naturalmente, se protegiam dos animais selvagens e de outros homens. Não tenho dúvidas que estamos perante um dos monumentos naturais de maior interesse na vertente sul do Cebolo.
Penso que o comentário anterior seja do ASP,e neste caso cumpre-me discordar da situação geográfica que ele atribui ao do Casal de Sta.Teresinha.Não é a sul do Cebolo mas a Norte,e mais precisamente a Nordeste. Assim como S. Jorge está a Sueste do mesmo Picoto.
Claro que o comentário anterior é do asp e ele queria dizer que o Casal de Santa Teresinha, aquela jóia que pertence à Freguesia de S. Jorge da Beira e que antes devia pertencer à de Sobral de S. Miguel, vamos abrir negociações para a cedência, ou para um referendo à poplação, fica na vertente Sul da Cordilheira Central, que corta Portugal a meio, Norte/Sul, desde a Malcata, pela Estrela, o Cabeço do Gondufo, as nossa Águas Ceiras e o do Açor, o cabeço do Cebolo, e a Serra da Lousã, Serra d'Aire, Montejunto e Sinta, quis abreviar mas mantenho, caro Virgílio, estimado amigo, vertente sul do Cebolo, que é para sul, que aqui as águas correm.
asp
Eu peço desculpa pela inúmeras gralhas que qualquer fundamentalista apanhe nestes meus textes. São escritos em velocidade, depois releio e as falhas são tantas que me envergonho deles. Por exemplo, onde consta poplação, obviamente queria escrever população. Se alguém, algum dia, protestar, deixarei de escrever aqui, e será menos um a aborrecer-vos ou a gralhar-vos.
asp
asp,geograficamente falando,eu tenho razão.Basta conferir as coordenadas dos pontos em questão. No entanto abdico de abrir aqui um fórum de discução a dois.4 anos da minha diáspora(peregrinação)foram passados a trabalhar em topografia e 43 semanas dos meus primeiros vinte anos a desenhar casas e mapas.Assim como as 43 semanas seguintes foram passadas debaixo da terra (em parte do Picoto) a furar o duro basalto que aloja a leitosa brancura do quartzo que contém as "pintas" negras do volfrâmio agora dito Tungsténio e as doiradas pepitas da pirite,também dito ouro dos tolos.
Um abraço para ti asp e outro para o fs que já não vejo há anos.
Caro Virgílio, se bem te lembras, há uma idade, em que dizemos que já temos razão, ou seja sabemos discernir entre o bem e o mal, encontramos a ordem ou sentido das coisas, compreendemo-las. em alguns casos com conhecimentos ditos científicos. Na História da Humanidade, também se invocou uma Idade da Razão. Depois pensou-se que ela tudo resolvia e entrou-se num ismo dito racionalismo. Afinal, descobriu-se que o homem, mesmo os mais sábios raramente conseguem conduzir a sua vida pela razão, que todos invocamos ter e os povos ainda menos, a Idade da Razão em nome dela trouxe guerra e mais querra etc. Obviamente os minutos que passamos por aqui, são para dar descanso à razão de termos de fazer trabalhos de que racionalmente vivemos e eu não me importo de perder a razão pelas coordenadas geográficas, e de ganhá-la pela amizade, mas explico-me, para que me entendam, não tu que já me entendeste, as águas que passam junto ao casal correm para a bacia do Tejo, a sul, as que descem a outra vertente vão para o Ceira e para a Bacia do Mondego, embora algumas sejam aproveitadas por túnel para a barragem de Santa Luzia e, portanto, também para a Bacia do Tejo. Agora, mais racionalmente, vou continuar a escrever sobre os Cistercienses em Portugal.
asp
Pois claro que a disposição deste pequeno lugar nos leva a imaginação para outros tempos ditos da Idade do Ferro. E é realmente possivel que tenha sido um pequeno castro a "pairar" sobre o resto do vale, contudo é mais a baixo que encontramos vestigios que nos remontam para esse tempo. Mais acima do "Descalço" existe um pequeno cabeço rodeado por uma pequena muralha, hoje não é visivel tantas são as giestas, silvas e gravetos que a cobrem. Contudo após o incêndio de 2001 o cabeço estava limpo e olhei para ela com satisfação tal, que me mandei a correr pela descida na sua direcção e só parei quando os bofes quase me saiam pela boca!!! Olhei, olhei e olhei, mas os meus olhos ainda eram olhos de estudante do 11º ano que sabia umas coisitas de arqueologia, portanto muita coisa me deve ter passado despercebida. Já mais tarde por volta de 2003 voltei lá e lá descobri mais umas coisas, uns vestigios de escoria e uns buracos de poste, que juntando às gravuras encontradas em muitas lajes e mamoas do nosso Açôr levam-nos a crer que muitos bravos por aqui tenham vivido! Não esquecer que a nossa serra é rica em estanho, e os romanos farejavam-no a milhas, portanto também devem ter passado por aqui sem que no entanto se tenham fixado.
Bem, que tenho agora a confirmação da nossa arqueóloga,
Aquela colina,assim, como aparece na fotografia, agora cheia de casas brancas, decerto foi encimada por um castro. Basta saber olhar. O castro que conheço melhor é o do Zambujal perto de Torres Vedras, quem for para a Praia de Santa Cruz, pode ir espreitar como viviam os homens há três mil anos. Este nosso mais elevado devia aproximar-se do modelo dos do Norte do País de que conhecemos o da citânia de Briteiros.
asp
Estive no Casal pela primeira vez creio,já de adulto.
Partilho a ideia de um castro pela configuração da encosta/colina além de estar rodeada de montanha em semi-arco,logo em posição de defesa.
Será ,com certeza,o povo mais antigo daquele vale.
fs
Caro FS,
Falamos aqui de uma anexa de S. Jorge da Beira com tanto empenho e ninguém desta freguesia ou daquele belo, embora pequeno, povoado, decerto, com mais de três mil anos, vem aqui dizer qualquer coisa, nem sequer na forma anónima, que este blogue permite.
asp
Pois é,amigo ASP,não fazemos rede do saber e os nossos vizinhos de São Jorge e alguns ,sendo nossos amigos/conhecidos,bem podiam dar a sua versão.Aliás,o blogue deles pode dar um contributo...Um problema como muitos..., deste País.
fs
A vista da belíssima Serra, do lado do Picoto, mas também a do lado do Cabeço da Nave (Sobral), suscita-me uma interrogação que os conterrâneos dedicados à agronomia (o meu primo Francisco) ou à História (o amigo António Pereira) ou outros poderiam responder: porque razão existem baldios do lado de lá da Serra e não existe um único baldio do lado de cá?
Como leigo, imputaria isso à maior ocupação da serra que existiu deste lado, de tal modo que houve a necessidade de cada um se ir apropriando do seu bocado de terra.
Mas porventura existirão outras explicações mais exactas que desconheço ligadas a factores históricos: ocupação, concessão, etc.
Uma coisa é certa: parece que toda a serra do nosso lado até à vertente, está dividida em parcelas, ao passo que do lado de lá, a partir da estrada, o terreno é baldio (tendo servido para apascentar o gado, cortar lenhas e mato, pelos respectivos "fregueses").
AAG
Meus caros amigos,
Sobre a questão colocada pelo nosso conterrâneo, AAG, também me tenho interrogado sobre a não existência de baldios nas extensas testadas do “nosso” Cabeço d’A Nave. E a aguardava uma oportunidade para a colocar aqui no blogue. Sobre esta questão, lembro-me do meu avô, João Pereira Marques (1874-1965) de contar que houve “lutas “ ou reuniões onde o pessoal do Sobral terá exigido que quem fosse dono dos “baixos” seriam também dono dos “altos”. Ou seja, do nível dos ribeiros/valados, até ao cimo dos montes: Águas-vertentes. E então a palavra de ordem era “Altos e baixos”. Notava que o meu avô ao falar neste assunto, deixava transparecer um certo orgulho e dava a entender que o facto de no Sobral não haver baldios não teria sido fácil. Eu, como catraio, certamente com outras preocupações, não explorei o assunto pelo que não sei onde, nem quando foram feitas essas negociações. Como sabemos, naqueles tempos, poucos sabiam escrever. Valia a palavra dada e depois o “costume”.
Também se contava que para a escolha dos indivíduos que governavam o Concelho da Covilhã, os homens do Sobral teriam que se dirigir à Igreja de Unhais da Serra para poderem votar. E a Fonte da ponte ou a própria Ponte parece ter sido resultado duma promessa feita por um desses eleitos. Contava também o meu avô que um dia marcado para a realização de uma dessas eleições teriam sido avisados para se rodearem de todas as cautelas pois os “Unhadenses” queriam fazer-lhes uma cilada para darem porrada na malta. Sendo a fonte de informação fidedigna (o aviso foi dado pelo Pároco, natural de Unhais, que nessa data paroquiava o Sobral), a malta do Sobral avançou sem medo, mas por outro caminho. Os Unhadenses fartos de esperar regressaram a Unhais e já os nossos antepassados tinham cumprido o seu dever de votar e claro, já não houve luta.
A figura dos baldios (terrenos de uso comum, designadamente para apascentar gado, cortar lenha ou mato) perde-se nos confins dos tempos, mas ainda nos nossos dias tem consagração legal. É uma forma específica de propriedade que, em vez de ser individual ou em regime de compropriedade,é colectiva ou comunitária).
Pese embora as mudanças que ocorreram, ainda hoje os baldios têm um regime jurídico próprio,sendo administrados por uma Comissão. Além disso, os terrenos baldios não podem ser objecto de apropriação privada, não podendo ser objecto de negociação.
Nas campanhas de florestação que ocorrerem no Estado Novo, houve a tentativa de o Estado se apropriar dos baldios, transformando-os em terrenos do domínio público estadual)bem diferente do regime comunitário).
Essas tentativas tiveram algum sucesso, mas defrontaram-se também com enorme oposição das populações que se viram desapropriadas de terrenos que podiam usar livremente (dentro do condicionalismo dos baldios).
O escritor Aquilino Ribeiro retrata essa época em diversos romances, entre os quais "Quando os Lobos Uivam".
Mas nada disto responde à pergunta: por que razão não existem baldios no Sobral, em S. Jorge ou em Casegas, mas já existem nas Cortes de Cima ou em Unhais da Serra e mais ainda na Teixeira?
Outro aspecto que me parece curioso, agora em sentido inverso, é o facto de os fornos serem comunitários (coisa diversa de pertencerem à Junta de Freguesia).
Trata-se de uma realidade bem diversa dos moinhos e dos antigos lagares: estes não eram nem comunitários nem públicos, antes pertenciam ou pertencem, em regime de compropriedade, aos diversos donos, sendo a proporção do direito formada, no que respeita aos moinhos, pelos dias de uso privativo.
AAG
A figura dos baldios (terrenos de uso comum, designadamente para apascentar gado, cortar lenha ou mato) perde-se nos confins dos tempos, mas ainda nos nossos dias tem consagração legal. É uma forma específica de propriedade que, em vez de ser individual ou em regime de compropriedade,é colectiva ou comunitária).
Pese embora as mudanças que ocorreram, ainda hoje os baldios têm um regime jurídico próprio,sendo administrados por uma Comissão. Além disso, os terrenos baldios não podem ser objecto de apropriação privada, não podendo ser objecto de negociação.
Nas campanhas de florestação que ocorrerem no Estado Novo, houve a tentativa de o Estado se apropriar dos baldios, transformando-os em terrenos do domínio público estadual)bem diferente do regime comunitário).
Essas tentativas tiveram algum sucesso, mas defrontaram-se também com enorme oposição das populações que se viram desapropriadas de terrenos que podiam usar livremente (dentro do condicionalismo dos baldios).
O escritor Aquilino Ribeiro retrata essa época em diversos romances, entre os quais "Quando os Lobos Uivam".
Mas nada disto responde à pergunta: por que razão não existem baldios no Sobral, em S. Jorge ou em Casegas, mas já existem nas Cortes de Cima ou em Unhais da Serra e mais ainda na Teixeira?
Outro aspecto que me parece curioso, agora em sentido inverso, é o facto de os fornos serem comunitários (coisa diversa de pertencerem à Junta de Freguesia).
Trata-se de uma realidade bem diversa dos moinhos e dos antigos lagares: estes não eram nem comunitários nem públicos, antes pertenciam ou pertencem, em regime de compropriedade, aos diversos donos, sendo a proporção do direito formada, no que respeita aos moinhos, pelos dias de uso privativo.
AAG
Passei ontem o meu tempo em trabalho intenso e só hoje noto como os meus amigos do Sobral se interessaram por uma matéria extraordinariamente interessante para qualquer historiador que se queira digno do nome. Para se ser digno do nome deve-se seguir no tempo longo a evolução das instituições, sustentado em documentos, para notar os cortes nas tradições, por factos legais, revolucionários ou outros. Já o fiz para a Ilha de S. Jorge e aí até é possível perceber como havia delimitações entre as terras senhoriadas e as baldias, reservadas ao pastoreio e ao fornecimento de lenhas e outros recursos aos que deles necessitassem, respeitando certas regras impostas a nível concelhio, geralmente conhecidas pelas designação de posturas municipais. De facto, toda a tradição oral que o nosso Sobral Filho apresenta também merece atenção, porém, há um facto histórico a que aqui já tenho apelado e que está sustentado nas chancelarias da Ordem de Cristo, que resolve em parte o problema. O território do Sobral, de S. Jorge, de Casegas, de Relvas, Silvares, Bogas, S. Martinho, Enxabarda e Castelejo, fazia todo parte da Comenda de Nossa Senhora da Silva do Castelejo, e os foreiros, sujeitos à dízima à Ordem e à redízima ao comendatário, lavradores, caseiros etc, beneficiavam de um estatuto especial dentro do concelho. Houve conflitos longos entre as autoridades concelhias e aqueles nos seu conjunto porque os nossos antepassados sempre invocaram que não deviam participar com trabalho nas obras concelhias, por exemplo na construção das calçadas da Covilhã, por serem privilegiados da Ordem. Este facto não é de somenos importância e aqui, fica a minha memória, ao sangue derramado. Quando as ordens e as comendas foram extintas com a revolução liberal, as terras das comendas, foram resgatadas pelos foreiros, ainda que com algumas liberdades de pastagens comuns em algumas partes que resultaram em conflitos graves. Pelo que a evolução normal foi para a propriedade plena que os liberais sempre defenderam. Onde a autoridade concelhia tinha tutela mantiveram-se os baldios, casos da Erada, Unhais, etc. O caso relatado por Aquilino e que lhe trouxe problemas no fim da vida abordei-o em «Aquilino Ribeiro, ao caleidoscópio, entre Paris, por Lisboa e a Beira Profunda», in Letras Aquilianas, n.º 1, 2007, pp. 37-67.
Caro António Pereira
A explicação que dás tem toda a lógica e, aliás, já a retirara do teu livro Portugal Adentro, onde abordas a matéria da Comenda da Ordem de Cristo.
Compreende-se que, depois, com a revolução liberal, os terrenos que eram agricultados pelos foreiros, tivessem sido resgatados, ficando a pertencer-lhes em propriedade plena.
Apesar disso, não deixa de ser estranho que toda a serra, onde nem sequer havia pinheiros ou outras árvores, tivesse sido apropriada, tanto mais que da Cabrieira para cima nem sequer existe terra arável.
Na minha posição de leigo, encontro uma razão plausível no número de pessoas que, apesar de tudo (sobre)viviam no Sobral, e, porque não dizê-lo, talvez num excessivo individualismo, determinado pela necessidade.
Com efeito, tendo em conta a actividade principal da pastorícia, seria mais adequado á sobrevivência de toda uma população a existência de baldios onde cada um, de acordo com as suas possibilidades ou necessidades, pudesse pastorear os rebanhos.
Bem sabemos como, até à década de 70, era "perigosa" a ideia de roçar mato na propriedade do vizinho ou entrar com as cabradas em propriedade alheia ...
AAG
Caro AAG
Sem muito trabalho de arquivo ficamos com muita escuridão quando olhamos a realidade. Um dos vícios estruturais do historiador é só descobrir a realidade depois de a ter encontrado no Arquivo. Passei milhares de vezes junto à ribeira da Líria em Castelo Branco e só a percebi quando a encontrei em documento de arquivo. Quanto à nossa serra, e a uma eventual questão de baldio, ideia perigosa depois do triunfo do ideário liberal, para além de perceber a ancestral tutela da Ordem do Templo/Cristo, que nos deve honrar a todos como descendentes dos lavradores da mesma,pois foi ela que liderou grande do esforço inicial de descoberta do Mundo, falta o estudo dos processos concretos que ao longo so século XIX, deram no apropriamento da mesma, embora com os direitos de pastoreio colectivo nos cimos escalavados dos montes. O Sobral filho apela à tradição e de facto minha mãe também me falava dos inúmeros rebanhos que atravessavam o sobral a caminho daquela. Também tens razão que os rebanhos expulsavam as gentes e que a multiplicação destas exigiu todo o recanto, mesmo os cimos dos montes, para prouzir pão. Eu ainda sou testemunha das searas de centeio, no cimo destes e depois dos milheirais onde houvesse um pingo de água.
asp
Quem de Castelo Branco viajar para a Covilhã ou vice-versa olhe Castelo Novo e perceberá o Casal de Santa Teresinha. A fronteira Norte/Sul esteve aqui mais tempo do que além. Só que o granito resiste mais ao desgaste do tempo do que o xisto, daí aquele ar mais arcaico de Castelo Novo, dita aldeia histórica. Mas aqui, junto de nós, tudo é mais majestoso.O cebolo tem mais 500 metros do que a Gardunha que protege aquele, os vales aqui são bem mais fundos e protegiam bem mais das investidas da Mourama ou da Cristandade, depende da perspectiva em que cada um se colocar. Com a multiculturalidade, já se imaginaram numa sala de aula com cristãos, muçulmanos, budistas, etc.
asp
Estou orgulhosa com os participantes do nosso blo. Cada vez que por aqui passo saio mais rica em conhecimentos. Não tenho tido muito tempo para ler tudo, apesar de achar que todos os temas e comentários são muito interessantes. Fico surpreendida com toda a história que envolveu o nosso Distrito, incluindo o nosso Sobral, suas gentes, e os seus vales e montes. Adorei tudo o que se falou aqui sobre a história do João Brandão, e das lutas dos liberais. Em relação aos baldios e também porque fui pastora,não me recordo deles a não ser do medo que eu tinha de deixar passar uma cabra para a floresta que começava no alto da serra do meu carvalhal e carvalho. Agradeço aos nossos sabedores da matéria pelo facto de aqui partilharem seus conhecimentos.
Caro ASP: fiquei esclarecido sobre o ponto de vista histórico e como foi determinante a Ordem do Templo/Cristo ,na ocupação/exploraçâo do espaço do território - ausência de baldios no Sobral e em São Jorge da Beira.
Há quem advogue que os baldios se circunscreveram a norte do sistema montanhoso Montejunto-Estrela e que se deve à influência da presença dos mouros no território nacional.
Como sabes,a implementação deste processo deu azo a vicissitudes e lutas,e porque não, alguma sagacidade e visão dos nossos antepassados creio,no século dezanove,como refere um anónimo anterior(talvez na época da criação das aldeias civis em 1880 o Sobral e no ano anterior São Jorge).
Os pastos para o gado ,as lenhas e o carvão para o aquecimento ,associado ao crescendo da indústria dos lanifícios na cidade da covilhâ,desenvolveu a actividade dos carvoeiros e a concorrência com os de Cortes do Meio.
fs
Caro fs,
Não creio que os baldios tenham a ver com a mourama. O Prof. José Mattoso defende um sentido mais comunitário nas populações do Nordeste Montanhoso Português, acima do dito sistema. As dificuldades da sobrevivência impunham-no e, de facto, é assim. Mas só Deus e os valores que ele representa de amor, justiça, paz,tranquilidade e sabedoria, são eternos. O resto tudo muda, até aquele bom sentido comunitário e não são raros os mais graves crimes em tais partes.
asp
asp
Começo por corrigir a data da elevação a freguesia civil que é 1888 para o Sobral,separando-se de Casegas como sabemos.
Sobre a tese do Prof.José Matoso também me parece mais verdadeira com a história e o espírito comunitário das populações a norte do Tejo.
Sobre a forma de exploração do território, além dos baldios e dos privados,há ainda as associações de compartes(Teixeira) e as autarquias(Alvoco da Serra, Cortes do Meio)-Juntas de Freguesia ditas ricas e outras sem património(Sobral).Aliás,um antepassado e autarca do Sobral ,contava que numa visita de alguém importante da Câmara da Covilhã lhe perguntou sobre os rendimentos e terrenos da Junta de Freguesia e a resposta não se fez esperar " que no Sobral havia apenas os Fragões da Eira da Ponte do Lugar como terrenos da Freguesia e a Eira da Ponte comunitária" para a malha dos cereais.Claro que temos também quatro fornos comunitários.
fs
A diversidade da vida é tão grande que, para além dos diversos tipos de propriedade que já foram referidos (propriedade plena, compropriedade de lagares e moinhos, domínio público da junta de freguesia e baldios), ainda existe uma particularidade nas aldeias do interior, incluindo no Sobral, que são as chamadas "oliveiras do senhor".
Ou seja, árvores cujas azeitonas serviam para arranjar azeite para as lamparinas (no tempo em que ainda se usava azeite), pertencendo à Igreja (ou melhor à paróquia ou à Fábrica da Igreja) que tanto pode ser proprietária do terreno e da oliveira como apenas proprietária da oliveira.
Neste último caso, em termos jurídicos, já não estamos verdadeiramente a falar de propriedade, mas de um "primo" que se chama "direito de superfície" em que o terreno pertence a uma pessoa e a árvore a outra.
AAG
Caro AAG,Ainda me lembro do nosso tempo da escola e catequese em que em algumas tardes de Domingo(PELA BOA CAUSA NÃO ERA PECADO)íamos "voluntáriamente" a pedido das catequistas apanhar azeitonas do Senhor nas oliveiras por baixo da Escola.
Aproveito a ocasião para remover uma dúvida:-no caso das oliveiras não é mais correcto dizer "uso fruto" e "direito de superfície" para os imóveis?
O comentário anterior é meu.
Virgilio Neves
Caro AAG
Volto ao sentido de propriedade que o liberalismo desenvolveu e que de facto pretendeu eliminar esses diversos tipos de tenência da terra ou outros bens na forma antiga, que geralmente era de direito de uso e melhoria dos mesmos e de transmissão "melhorados e não piorados" aos vindouros. Mesmo o rei assim devia fazer em relação ao reino que recebia e devia transmitir ao herdeiro. Agora quanto às oliveiras do Senhor, geralmente resultam de doações em verba testamentária. Há muita documentação nas confrarias que informa sobre estas doações e as respectivas condições em que foram feitas, impondo, em alguns casos, missas pela alma. Na nossa terra, são poucas, porque somos todos apenas remediados e uma ou duas oliveiras eram sempre muito importantes, mas em freguesias de gente mais rica, esta salvava a alma ricamente, decerto, depois de também muitos mais "ricos" pecados.
O comentário anterior é do asp que algumas vezes se esquece de que este diálogo não é presencial.
asp
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