Ti Jaquina
"Sempre fui corajosa. Em criança não me atrapalhava com o “papão” o “homem do saco” e outros que os adultos têm a mania de nos impingir quando querem conseguir algo de nós. Mas existia uma figura, bem Humana, que foi durante muito tempo o meu grande medo. Era ela a “ti Jaquina” do Sobral, que muitos se devem também recordar, principalmente os da minha geração e os da anterior.
Segundo “reza a lenda” a sra (que Deus lhe guarde a alma) tinha receio que a casa onde morava se desmoronasse. Vai daí, era vê-la colocar pedrinhas nos espaços livres da parede, pelo menos até onde a sua altura o permitisse. Acontece, que muitas vezes com as condições climatéricas, outras mesmo por brincadeira da criançada que gostava de a arreliar, as pedras caíam (ou eram retiradas) e era então ouvir a sra a refilar, a ameaçar, muito zangada!
Por essas razões, a Ti Jaquina ia controlando tudo do alto da sua janela, sem vidraças, e em cujo parapeito se podiam distinguir uns calhaus rolados, que se dizia servirem para atirar aos “infractores”. Qualquer movimentação ou barulhinho na rua, lá espreitava ela.
De vez em quando viviam-se situações extremas. Bastava alguém passar, mesmo casualmente, mais junto àquele lado da rua, que não se livrava dum ralhete.
Sei também do caso duma criança que comia um pedaço de “queijo corno” e a sra ao vê-la com o queijito na mão e pensando que era uma pedrita da parede quase lhe batia.
Eu então, bastava “pressentir” o vulto na janela, metia-me sossegadinha em casa. Quando por azar a bola ou o hula-hula das brincadeiras rebolava e parava junto à casa, era uma choradeira! E tinha de arranjar alguém que me fosse buscar as coisas (os papás, claro!). Eu disse que sempre fui corajosa?! :-)
Mais tarde, já em fase de doença da sra e eu mais velhinha, entrei lá em casa (coisa impensável!) para uma visita de solidariedade. Nessa altura perdi o medo, deixou de ter fundamento, estava ali um Ser Humano com todas as suas fragilidades.
Hoje rio-me quando recordo esses tempos e dou por mim a observar a casa que entretanto substituiu a casa da velha sra. Penso também no que terá sentido a sra (se é que do outro lado tb se sente) quando a demoliram. E tiro como ensinamento que não vale a pena viver com preocupações desnecessárias, com guerrinhas e inimizades, pois um dia nós partimos e tudo fica."
Serranita
7 comentários:
Bem, serranita... devemos ser vizinhos pq toda esta "estória" da ti jaquina me é familiar... toda e tb aquela de q de vez em qd eramos vitimas mm sem ter culpa. Qd saiamos da escolinha e vinhamos todos em "matilha" à noite, sim pq às 18h30 era de noite - qd ñ ficavamos de castigo... q o prof Rito ñ perdoava... lá vinham laranjas podres, ou lages de ardósia... para nos acertar... e era por pouco!!! Mas a ti Jaquina, ñ media os actos e aí daqueles como eu... q passavam por ali!!! Chegava a ir pelo carreiro da "Ti Reinalda" para ñ ter q passar por baixo da velha janela, da velha senhora... q saudades...
Então somos vizinhas!:-) Eu tb me escapava pelo carreiro da "Ti Reinalda" que já nem existe (dava um jeitão!), nem a fonte...A rua mudou!
Entre esta e muitas outras histórias nos recordamos nós...
O tempo passa, nós ficamos mais velhos(as),mas as recordações essas são para a vida.
Que saudades!!!
Bela prosa Serranita... gostei da recordação da Tiá Xquina que era irmã da minha avó Maria. Tanto nos lambuzava de beijos (mé ric sbrinho) como nos ameaçava com a vassoura da gestas quando lhe buliamos nos pedriscos da parede.Desde a m/ infância que a via a apanhar azeitonas p/ m/ pai.E CARREGOU-ME às cavalitas muitas vezes por aqueles caminhos, Valminhoto,Casal da Pires e Carvalho.Ajudava a animar a malta ...Tambem era ela a vigilante (chefe) do forno do vale que ficava porta c/ PORTA. qd eu tinha 5 anos o m/ pai comprou uma égua e era na loge da tiá Xquina que ela dormia...todos os dias ia levar a égua beber água à rebera e assim andava a cavalo mais os m/ 5 irmãos , pois o mais novo era bébé... belos tempos ...
eu também me lembro bem da ti jaquina e conheço essas histórias todas, afinal ela morava mesmo ao lado da minha casa. Naquela rua quase não podia dar uns toques numa bola, e então se ela sonhasse que estava alguém encostado na parede aí Jesus. Hoje no local existe outra casa, mas a da ti Jaquina deixa saudades, como tinha o telhado baixinho dava á vontade para escrever nas lages ou mesmo par andar empuleirado em cima dele.
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