Esta foto,recorda-me um acto de aflição na minha meninice. Na minha memória permanece a imagem do poço quando eu caí ao apanhar água com uma latinha, para fazer bolos de terra. Brincadeira que eu e as minhas vizinhas daquele tempo fazíamos.Foi de tal forma marcante, queria ficar de pé mas ia ao fundo,voltava acima fazia o mesmo e tornava ao fundo. Mais tarde no desporto que mais gosto de praticar- natação - refletiu-se em não conseguir pôr a cabeça debaixo da água. Com muito custo lá fui conseguindo ultrapassar o problema com a ajuda do professor que me foi "obrigando" a sentar no fundo da piscina. Apesar de gostar de praia e saber nadar um pouco,nunca saio fora de pé. Tenho de concluir que foi trauma daquela aflição, então vivida, naquele poço.
Esta perspectiva invernal, que é idêntica à estival, podia ser invertida e dar-nos-ia uma outra informação patrimonial aqui presente na levada. De facto, este açude que formou o Poço do Ti Abrantes foi feito para fornecer a levada de água para o moinho e o lagar, situados 100 metros abaixo. Trata-se de duas peças interessantes do aparelho produtivo mais antigo do Sobral. Aquele moinho aguentava quase todo o verão a moer e, no Inverno, entre Dezembro e Janeiro trabalhava o lagar ao lado, bem diferente do lagar do Meio e do Cimeiro. Para bem de todos nós e bem diferente do que acontece em outras partes, quando há cheias na ribeira do Sobral, a água corre limpa. Deus seja louvado.
Virgilio, bonita a tua foto, que para além da originalidade da carrinha... nos dá uma imagem de um Inverno chuvoso que, como se deseja, limpa a ribeira e torna o caudal limpo.
Grande susto Mina! Mas constato que as lembranças que as imagens nos trazem são um bom momento de partilha.
Deste sítio e em cima da ponte (que era como se dizia um pontão e sem grades...), tenho a imagem de muitos de nós saltando ou correndo para lá e para cá, num claro desafio à ribeira e à força das águas! Mais tarde soube que em tempos idos, uma criança afoita como todos nós se excedeu, deixando a ribeira de ser brincadeira e alegria, para se tornar naquele dia em mortalha e no desespero dos pais.
Essa tragédia que a Mariita menciona aconteceu ha mais de sessenta anos, 62-63 anos. Esse moço do qual ja nâo me recordo bem o nome, mas creio se chamava Arlindo, era um companheiro da escola e de classe.
A escola nesse tempo era nessa casa que ainda existe e, penso têm uma placa comemorativa a esse respeito, era e é nas escadas que desciam para a casa do ti "galhetas" (Virgilio e Mina) e ali ao lado morava o ti Antonio "guerrilha".
Esse caso (acidente) aconteceu no pontâo que dava acesso justamnete ao moinho e ao lagar. E, como a maioria dos pontôes desses tempos, era feito com lages.
Recordo ainda que o Arlindo foi encontrado tres dias depois, por um tio seu, ja depois das ribeiras do Sobral e de Cebola se terem juntado e muito perto do rio Zêzere.
Num espaço de cinco anos mais ou menos, aconteceram no Sobral outros dramas semelhantes a este mas pelo fogo. Um outro companheiro da escola e uma senhora, morreram queimados. O companheiro no Caratâo e a Sra. nas vinhas.
Certamente que havera ainda outras pessoas que se recordam dessas tragédias.
Anónimo, Tens razão quanto ao nome, Arlindo, irmão do Zé “da Eira” (que trabalhou na TAP). Era filho do Ti Augusto que morava no caminho dos Torgais.
De facto o pontão era mais abaixo, mais ou menos, aonde hoje está a ponte de pedra que dá acesso ao moinho mas, parece-me que já era de tábuas (?).
No que concerne às escadas que confinavam com a escola e que davam acesso à Rua do Vale, não era ali que morava o Ti António “Guerrilha”. Este morava mais à frente no sentido da casa do Sr. Chico, ao pé da parte de baixo da casa do Ti Marcelino (alfaiate) e também ao lado duma escadaria (daí a confusão).
Quanto à placa comemorativa da escola penso que já não existe (?).
A casa das vinhas onde ardeu a Senhora que era avó da Antónia, esposa do Zé Tomé, tinha duas entradas: uma pela lado das Vinhas, outra pelo lado da Travessa da Rua do Adro, onde eu morava. Creio que andava pelos 5 anos, não me lembro, e terei sido eu o primeiro a dar o alarme, pois estava a brincar na minha varanda, quando vi sair muito fumo e o barulho das chamas e fui ter com uma das minhas irmãs à cozinha. Depois os sinos tocaram a rebate e juntaram-se muitas pessoas com caldeiros de água da ribeira e do chafariz do Adro e apagaram o fogo tendo-se encontrado a senhora já carbonizada.
Aqui, ficam descritos alguns dos males antigos, hoje são outros, particularmente os atropelamentos e não fora o acesso mais rápido aos hospitais, as mortes seriam muitas. De facto, as cheias no Sobral trazem à geração dos cinquenta /sessenta estas memórias e o fogo também. Da doença, nem vale a pena falar. Fico em lágrimas. Rezo pelas vítimas que vivem na nossa ternura e na mágoa dos familiares. A vida é uma ribeira de Lágrimas e corre tão breve como a ribeira do Sobral
Foi depois da morte do Arlindo é que o pontâo foi feito entâo com tàbuas e um pouco mais largo.
Serranita.
Desejo informa-la, que esse incendio que levou essa Sra. que diz ser sua trisavò, aconteceu num Domingo uma ou duas horas depois da missa. Mais ou menos uma hora da tarde. Talvez que o nosso amigo Sobralfilho se lembre melhor que eu.
Sensacional. O Sobral tem recantos maravilhosos, dignos de postais. Parabéns a todos os que conseguem captar momentos destes.
Se me lembro. Nunca esqueci. Já passados tantos anos, com uma vivência fora e dentro do país, sempre que passo na rua do "Ti Galhetas" (pessoa que recordo sempre e enquanto for viva, pela sua disponibilidade para todos fiando sempre que se lhe pedia, nunca voltando a cara às misérias dos outros... Era uma criatura fora de série!...)e me quedo a olhar a outra margem, pergunto-me: Porquê? Porque tinha de acontecer uma tragédia assim a um garoto da minha idade que, apenas queria brincar, ainda que desafiando o perigo daquelas águas. Não sei se os do meu tempo se recordam que se faziam apostas para ver quem chegava primeiro ao outro lado. Coisas de crianças .... Eu andava na 3ª classe. Era irmão do Zé da Eira. Não sabia que se chamava Arlindo... Deixo esta pequena homenagem.
Trágica Recordação
Meu Deus! meu Deus! quando me lembro agora De o ver brincar, e avisto novamente Seu pequenino Vulto transcendente, Mas tão perfeito e vivo como outrora!
Julgo que ele ainda vive; e que, lá fóra, Fala em voz alta e brinca alegremente, E volve os olhos verdes para a gente, Dois berços de embalar a luz da aurora!
Julgo que ele ainda vive, mas já perto Da Morte: sombra escura, abysmo aberto... Pesadêlo de treva e nevoeiro!
Ó visão da Creança ao pé da Morte! E a da Mãe, tendo ao lado a negra sorte A calcular-lhe o golpe traiçoeiro!
Bem-hajas Maria, pela partilha de memórias que fazes no blog, assim como as bonitas poesias que nos transmites.Ao relembrares o meu pai desta forma, tocaste na minha profunda sensibilidade, que desde criança e até aos dias de hoje, foi e ainda é o homem que sempre quero imitar, pela sua bondade e sentido de justiça. Sim, efectivamente o nosso Sobral tem cantos e recantos bonitos e aquele que está em questão, é um deles. Não é só por ser a minha rua (Rua de baixo...), mas, árvores frondosas, o cantar da água a cair no poço e o coaxar das rãs, tudo isto um verdadeiro hino à natureza, especialmente nas noites de Verão, onde nós, crianças, alegremente ali brincávamos, traz-nos, no presente, muitas e boas memórias.
15 comentários:
A MINHA FOTO É DE Dezembro de 2009 e a carrinha continua lá no mesmíssimo lugar...
Está um pouquinho mais à frente! Ora veja.
Esta foto,recorda-me um acto de aflição na minha meninice. Na minha memória permanece a imagem do poço quando eu caí ao apanhar água com uma latinha, para fazer bolos de terra. Brincadeira que eu e as minhas vizinhas daquele tempo fazíamos.Foi de tal forma marcante, queria ficar de pé mas ia ao fundo,voltava acima fazia o mesmo e tornava ao fundo. Mais tarde no desporto que mais gosto de praticar- natação - refletiu-se em não conseguir pôr a cabeça debaixo da água. Com muito custo lá fui conseguindo ultrapassar o problema com a ajuda do professor que me foi "obrigando" a sentar no fundo da piscina. Apesar de gostar de praia e saber nadar um pouco,nunca saio fora de pé. Tenho de concluir que foi trauma daquela
aflição, então vivida, naquele poço.
Esta perspectiva invernal, que é idêntica à estival, podia ser invertida e dar-nos-ia uma outra informação patrimonial aqui presente na levada. De facto, este açude que formou o Poço do Ti Abrantes foi feito para fornecer a levada de água para o moinho e o lagar, situados 100 metros abaixo. Trata-se de duas peças interessantes do aparelho produtivo mais antigo do Sobral. Aquele moinho aguentava quase todo o verão a moer e, no Inverno, entre Dezembro e Janeiro trabalhava o lagar ao lado, bem diferente do lagar do Meio e do Cimeiro.
Para bem de todos nós e bem diferente do que acontece em outras partes, quando há cheias na ribeira do Sobral, a água corre limpa. Deus seja louvado.
Virgilio, bonita a tua foto, que para além da originalidade da carrinha... nos dá uma imagem de um Inverno chuvoso que, como se deseja, limpa a ribeira e torna o caudal limpo.
Grande susto Mina!
Mas constato que as lembranças que as imagens nos trazem são um bom momento de partilha.
Deste sítio e em cima da ponte (que era como se dizia um pontão e sem grades...), tenho a imagem de muitos de nós saltando ou correndo para lá e para cá, num claro desafio à ribeira e à força das águas!
Mais tarde soube que em tempos idos, uma criança afoita como todos nós se excedeu, deixando a ribeira de ser brincadeira e alegria, para se tornar naquele dia em mortalha e no desespero dos pais.
Essa tragédia que a Mariita menciona aconteceu ha mais de sessenta anos, 62-63 anos.
Esse moço do qual ja nâo me recordo bem o nome, mas creio se chamava Arlindo, era um companheiro da escola e de classe.
A escola nesse tempo era nessa casa que ainda existe e, penso têm uma placa comemorativa a esse respeito, era e é nas escadas que desciam para a casa do ti "galhetas" (Virgilio e Mina) e ali ao lado morava o ti Antonio "guerrilha".
Esse caso (acidente) aconteceu no pontâo que dava acesso justamnete ao moinho e ao lagar. E, como a maioria dos pontôes desses tempos, era feito com lages.
Recordo ainda que o Arlindo foi encontrado tres dias depois, por um tio seu, ja depois das ribeiras do Sobral e de Cebola se terem juntado e muito perto do rio Zêzere.
Num espaço de cinco anos mais ou menos, aconteceram no Sobral outros dramas semelhantes a este mas pelo fogo.
Um outro companheiro da escola e uma senhora, morreram queimados. O companheiro no Caratâo e a Sra. nas vinhas.
Certamente que havera ainda outras pessoas que se recordam dessas tragédias.
Anónimo das 13:44,
Anónimo,
Tens razão quanto ao nome, Arlindo, irmão do Zé “da Eira” (que trabalhou na TAP). Era filho do Ti Augusto que morava no caminho dos Torgais.
De facto o pontão era mais abaixo, mais ou menos, aonde hoje está a ponte de pedra que dá acesso ao moinho mas, parece-me que já era de tábuas (?).
No que concerne às escadas que confinavam com a escola e que davam acesso à Rua do Vale, não era ali que morava o Ti António “Guerrilha”. Este morava mais à frente no sentido da casa do Sr. Chico, ao pé da parte de baixo da casa do Ti Marcelino (alfaiate) e também ao lado duma escadaria (daí a confusão).
Quanto à placa comemorativa da escola penso que já não existe (?).
A casa das vinhas onde ardeu a Senhora que era avó da Antónia, esposa do Zé Tomé, tinha duas entradas: uma pela lado das Vinhas, outra pelo lado da Travessa da Rua do Adro, onde eu morava. Creio que andava pelos 5 anos, não me lembro, e terei sido eu o primeiro a dar o alarme, pois estava a brincar na minha varanda, quando vi sair muito fumo e o barulho das chamas e fui ter com uma das minhas irmãs à cozinha. Depois os sinos tocaram a rebate e juntaram-se muitas pessoas com caldeiros de água da ribeira e do chafariz do Adro e apagaram o fogo tendo-se encontrado a senhora já carbonizada.
Aqui, ficam descritos alguns dos males antigos, hoje são outros, particularmente os atropelamentos e não fora o acesso mais rápido aos hospitais, as mortes seriam muitas. De facto, as cheias no Sobral trazem à geração dos cinquenta /sessenta estas memórias e o fogo também. Da doença, nem vale a pena falar. Fico em lágrimas. Rezo pelas vítimas que vivem na nossa ternura e na mágoa dos familiares. A vida é uma ribeira de Lágrimas e corre tão breve como a ribeira do Sobral
Adoro esta fotografia, adoro o lugar, tenho boas recordações da ribeira...
Só para festejar os 5 anos do blogue. Parabéns.
As coisas que se vão investigar e se aprendem a partir do blog. Fiquei a saber que a Sra que morreu carbonizada, aqui falada, era minha trisavó!
Meu caro amigo Sobralfilho.
Foi depois da morte do Arlindo é que o pontâo foi feito entâo com tàbuas e um pouco mais largo.
Serranita.
Desejo informa-la, que esse incendio que levou essa Sra. que diz ser sua trisavò, aconteceu num Domingo uma ou duas horas depois da missa. Mais ou menos uma hora da tarde.
Talvez que o nosso amigo Sobralfilho se lembre melhor que eu.
Sensacional. O Sobral tem recantos maravilhosos, dignos de postais. Parabéns a todos os que conseguem captar momentos destes.
Se me lembro. Nunca esqueci. Já passados tantos anos, com uma vivência fora e dentro do país, sempre que passo na rua do "Ti Galhetas" (pessoa que recordo sempre e enquanto for viva, pela sua disponibilidade para todos fiando sempre que se lhe pedia, nunca voltando a cara às misérias dos outros... Era uma criatura fora de série!...)e me quedo a olhar a outra margem, pergunto-me: Porquê? Porque tinha de acontecer uma tragédia assim a um garoto da minha idade que, apenas queria brincar, ainda que desafiando o perigo daquelas águas. Não sei se os do meu tempo se recordam que se faziam apostas para ver quem chegava primeiro ao outro lado. Coisas de crianças .... Eu andava na 3ª classe. Era irmão do Zé da Eira. Não sabia que se chamava Arlindo...
Deixo esta pequena homenagem.
Trágica Recordação
Meu Deus! meu Deus! quando me lembro agora
De o ver brincar, e avisto novamente
Seu pequenino Vulto transcendente,
Mas tão perfeito e vivo como outrora!
Julgo que ele ainda vive; e que, lá fóra,
Fala em voz alta e brinca alegremente,
E volve os olhos verdes para a gente,
Dois berços de embalar a luz da aurora!
Julgo que ele ainda vive, mas já perto
Da Morte: sombra escura, abysmo aberto...
Pesadêlo de treva e nevoeiro!
Ó visão da Creança ao pé da Morte!
E a da Mãe, tendo ao lado a negra sorte
A calcular-lhe o golpe traiçoeiro!
Teixeira de Pascoaes, in 'Elegias'
Maria Ideias
Muito bonito Maria!
Bem-hajas Maria, pela partilha de memórias que fazes no blog, assim como as bonitas poesias que nos transmites.Ao relembrares o meu pai desta forma, tocaste na minha profunda sensibilidade, que desde criança e até aos dias de hoje, foi e ainda é o homem que sempre quero imitar, pela sua bondade e sentido de justiça.
Sim, efectivamente o nosso Sobral tem cantos e recantos bonitos e aquele que está em questão, é um deles. Não é só por ser a minha rua (Rua de baixo...), mas, árvores frondosas, o cantar da água a cair no poço e o coaxar das rãs, tudo isto um verdadeiro hino à natureza, especialmente nas noites de Verão, onde nós, crianças, alegremente ali brincávamos, traz-nos, no presente, muitas e boas memórias.
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